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Bônus da indústria ao varejo cresce 160%

Auditores questionam transparência na forma como esses montantes são contabilizados pelas redes

A política de bonificações negociada entre indústria e varejo, em acordos comerciais que envolve o pagamento de dinheiro às lojas, tem feito engordar o caixa das varejistas nos últimos anos. O volume chegou a mais que dobrar ao crescer quase 160% nos últimos cinco anos, segundo balanço financeiro das varejistas encaminhado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Esses montantes se referem aos bônus pagos pelos fornecedores para que as redes varejistas se movimentem e criem ações para vender mais produtos desses fabricantes nas lojas. É uma espécie de "incentivo comercial", como explicam as próprias varejistas em suas demonstrações financeiras. As partes definem metas e, se ela é atingida, a bonificação é liberada. A prática é legal e comum em mercados de consumo mais maduros, como Estados Unidos e Europa.

No entanto, auditores da área dizem não há normas contábeis que regulem essas práticas no Brasil, de maneira a deixar mais claro a forma como elas contabilizam esses incentivos.

"Essas bonificações inflam os ativos das varejistas porque entram como recebíveis", diz Vinicius de Castro Alves Sampaio, ex-Ernst Young e sócio da Baker Tilly Brasil Fortaleza Auditores Independentes. "Mas se por alguma razão, a meta do acordo não é atingida e esse recebível acaba sendo menor do que o esperado, é preciso dar baixa nisso como perda", diz. "E a forma como provisionam isso pode varia de acordo com cada empresa."

Esse debate se intensificou no mercado nos últimos dias depois que o Valor noticiou que o Carrefour no Brasil está passando por uma auditoria de suas contas. A matriz na França contratou a KPMG para avaliar a necessidade de fazer "ajustes contábeis" nos resultados de sua filial, relacionados a bonificações não recebidas nas negociações com a indústria.

Dados dos balanços semestrais deste ano das maiores varejistas de capital aberto do país mostram que chega a R$ 759 milhões o valor que elas têm a receber, por conta de "afinidades ou parcerias comerciais", informam elas. O volume é mais que o dobro dos R$ 291,9 milhões apurados em 2005. Nesse cálculo estão dados do Grupo Pão de Açúcar, Lojas Americanas e B2W (que inclui Submarino). Renner e Riachuelo não possuem negociações nesses moldes.

Na outra ponta da cadeia, a fabricante Hypermarcas tem ampliado os seus desembolsos para esses incentivos. Em 2009, foram R$ 140,2 milhões aplicados em verbas e acordos comerciais "que visam principalmente exposição adicional e divulgação de produtos junto aos consumidores". De janeiro a junho deste ano, a soma atingiu R$ 108,2 milhões, mais de 70% do montante total de 2009. A compra de novas empresas pela Hypermarcas ampliou esse volume, já que passou a ter que firmar mais acordos com o varejo. Em 2006, o primeiro ano com dado disponibilizado pela fabricante, o volume desembolsado em ações de parceria com as redes foi bem menor, de R$ 33 milhões.

Na Lojas Americanas, rede com maior elevação nos valores, o volume de recebíveis proveniente dessas negociações cresceu mais de 1.200% entre 2005 e 2010. O grupo Pão de Açúcar apresentou estabilidade nesses montantes ao longo dos anos, girando em torno de R$ 250 milhões a R$ 300 milhões ao ano em recebíveis provenientes de acordos com fornecedores.

São recursos que incluem, por exemplo, o pagamento de reembolsos se a empresa vender lotes de produtos a mais do que o acertado nos acordos de compra e venda. Batizado de "bonificação por volume", esse modelo é o mais comum no Brasil hoje.

"O problema é que, se esse reembolso vem em forma de mercadoria, não se pode deixar de contabilizar essa entrada nos resultados. E lembrar que essa entrada não gera crédito de PIS e Cofins", diz um diretor comercial de uma grande varejista. "Há uma série de nuances nessas negociações para as quais é preciso ficar atento, principalmente em relação a como fazer a provisão de bônus que não entram", diz.

No Brasil, ainda existem lacunas em normas contábeis, sem posicionamentos formais sobre bonificações e descontos por parte da CVM e do Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon). Lá fora, isso mudou, por conta de um escândalo recente. Os resultados da operação americana da varejista holandesa Ahold, entre 2000 e 2002, foi superavaliado em US$ 880 milhões. Executivos da empresa inflaram as bonificações. Em 2002, a comissão americana de padrões contábeis criou normas mais rígidas para o setor de varejo.

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