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Reforma tributária desconsidera pequenas empresas, avaliam debatedores
Em audiência da CDH, especialistas criticaram três PECs que propõem mudanças no sistema tributário
Presidente do Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis de São Paulo (Sescon/SP), Reynaldo Lima Junior, destacou que as proposições (PECs 45/2019, 110/2019 e 128/2019) apresentam falhas, como alíquotas uniformes e transição longa entre o sistema tributário atual e as novas regras.
— Por que não fazer uma transição em 180 dias? Nos anos 1990, fizemos a transição do Plano Real em seis meses, sem a tecnologia de hoje, e o povo todo entendeu o processo. Rapidamente tivemos a transição, trocamos a moeda do país. Com a tecnologia de hoje, podemos ter esse processo transitório — afirmou.
O representante do Sescon/SP disse ainda que o Simples Nacional foi “abandonado” nas três propostas de reforma tributária. Ele destacou que o regime compartilhado de arrecadação, cobrança e fiscalização de tributos das micro empresas contempla cinco milhões de empreendimentos, que representam 97,5% das empresas do país.
— Essas empresas representam quase um quarto do Produto Interno Bruto (PIB) ou 60% da mão de obra efetiva do pais. Elas não estão sendo tratadas com o devido cuidado, elas são o colchão que está sustentando toda essa crise que o país está enfrentando. É uma questão social. O modelo de reforma em que acreditamos incluiria faixas de alíquota, direito ao crédito do Simples Nacional, carga tributária equilibrada em todos os setores e desoneração da folha de pagamentos — afirmou.
Justiça social
Na avaliação do diretor jurídico do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz), Giuliano Menezes Campos, as propostas de reforma tributária “estão preocupadas com tudo, menos com a justiça social”.
— O Brasil é o único país em crise em que bancos aumentam sua lucratividade, e a reforma tributária não vai mexer nisso. É muito ambicioso falar que estamos diante de uma reforma tributária. Estamos diante de uma reforma que busca a simplificação tributária, sem enfrentar a desigualdade social — afirmou.
Campos ressaltou que reforma a ser aprovada pode até mesmo agravar o modelo desigual que persiste no pais, tendo em vista que a carga tributária das pequenas empresas poderá crescer até 300%.
— A reforma tributária toca apenas nos impostos reais e não faz nenhuma referência aos impostos pessoais, sem falar no imposto sobre grandes fortunas, que continua aí na Constituição, sem a menor perspectiva de regulamentação. A reforma tributária não aprofunda a discussão acerca da progressividade das alíquotas do Imposto de Renda, que em sua essência é injusto, pois as deduções da pessoa física são regressivas — afirmou.
Ataque aos direitos
Procurador da Fazenda Nacional, Heráclio Mendes de Camargo apontou um “ataque mundial em escala global aos direitos”, com abrangência geopolítica que não pode ser ignorada. Ele ressaltou que o sistema tributário é uma das formas pelas quais a desigualdade é institucionalizada no Brasil, assim como o sistema da dívida interna, as políticas de renúncia fiscal em favor dos muito ricos, a privatização de ativos públicos sob o pretexto de redução de déficit público e a criação de novas empresas estatais para operar a securitização de créditos públicos.
— Tributamos as famílias e seu consumo, mas somos suaves com o patrimônio dos ricos. Os mais pobres pagam mais tributos que os mais ricos, esse sistema funciona em colisão frontal com o disposto na Constituição. Os grupos que formam a base da pirâmide social e da matriz econômica são gravemente penalizados com um sistema tributário complexo e injusto. Em vez de tributarmos as grandes fortunas e as empresas petrolíferas, o Brasil oferece uma renúncia fiscal que atingirá R$ 1 trilhão em 25 anos — afirmou.
Simplificação tributária
Delegado sindical do Sinprofaz no Ceará, André Luiz Freire Allemão disse que as três propostas de emenda à Constituição não representam uma reforma tributária, mas apenas uma “simplificação” tributária no tocante à arrecadação de pessoas físicas. Ele ressaltou que as três matérias não abordam pontos nevrálgicos da questão fiscal no Brasil. Ele criticou a Lei 9.249, de 1995, editada no primeiro governo Fernando Henrique Cardoso, que isentou os dividendos entregues aos acionistas das maiores empresas brasileiras do imposto de renda.
— Somos descontados na fonte, antes do creditamento dos nossos salários, e o proprietário da Ambev, o Jorge Paulo Lemann, não desconta imposto de renda dos dividendos que recebe de suas atividades empresariais. Essas propostas deverão ser aprovadas com esse conteúdo? — questionou.
André Luiz disse ainda que “existe uma ideologia no Brasil, utilizada pela mídia tradicional e pela elite”, para que essas questões não sejam discutidas e não sejam resolvidas.
— O Brasil só perde em concentração de renda para o Qatar, um país que não tem tradição democrática. No Brasil, um por cento da população concentra 52% da renda nacional. E aí querem nos convencer que essas propostas que estão tramitando aqui vão resolver esses problemas — afirmou.
Desigualdade social
Procurador da Fazenda Nacional e professor de direito tributário, Leonardo Alvim disse que o Brasil “massacra” com a carga tributária no consumo e tributa pouco determinadas expressões de riqueza que pessoas mais pobres não têm condições de apresentar. Daí porque os mais pobres pagam mais impostos que os mais ricos.
— A única reforma que poderia mudar a distribuição de renda no Brasil é a tributária, mas nenhuma das propostas que estão na mesa altera essa roda de desigualdade vergonhosa em que o Brasil se insere. Mas todas as três são melhores que o quadro que temos hoje — afirmou.
Também dirigente do Sinprofaz, o procurador Achilles Linhares apontou um “jogo de cena” do governo ao anunciar o envio ao Congresso de projeto de lei que pune o devedor ilícito, como forma de quebrar a resistência dos parlamentares à aprovação da reforma da Previdência (PEC 6/2019). O texto deve ser promulgado nos próximos dias, enquanto o PL 1.646/2019 ainda aguarda parecer de relator em uma comissão especial da Câmara.
— A gente não conseguiu aprovar nem um projeto de lei ordinária que pune o devedor contumaz [da Previdência]! É o desmonte do Estado, a ausência de controle, a selvageria do capital, facilitando a atuação desmedida do capital financeiro — afirmou.
Presidente da CDH e proponente do debate, o senador Paulo Paim (PT-RS) disse que a reforma tributária deveria ser apresentada de forma prioritária, antes mesmo da reforma trabalhista ou outras alterações na atual legislação.
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