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O medo hoje no Brasil é do que já é conhecido
O brasileiro tenta fugir de um espectro que já conhece. Teme que não venham coisas novas, que estejamos fadados a ser um país do pelotão intermediário
"Se Lula for eleito, 800 000 empresários deixarão o país.” O empresário Mário Amato, ex-presidente da Fiesp, sempre foi conhecido por suas bravatas e declarações politicamente incorretas, frequentemente tachadas de reacionárias.
A ameaça de êxodo do empresariado, às vésperas da eleição presidencial de 1989, só corroborou sua fama. Lula não foi eleito na ocasião — e, mesmo que assim fosse, 800 000 empresários não deixariam o Brasil, como não deixaram após o confisco do governo Fernando Collor e nos anos de inflação estrondosa que se seguiram.
A declaração de Amato era fruto do medo, não importa se justificado. E o medo é o mais cruel inimigo da iniciativa.
O Brasil de 2014 é um Brasil diferente daquele de 1989. Vinte e cinco anos foram suficientes para transformar o país e sua economia — de maneira geral, para melhor.
O país às vésperas da primeira eleição direta após um longo período de ditadura era uma quase piada, um zé-ninguém no cenário internacional, com uma indústria montada sobre sucata, uma inflação pornográfica, sem classe média e onde a pobreza significava quase sempre indigência.
O Brasil de hoje tem uma economia quase duas vezes maior, conta com uma renda média 44% superior e uma escala respeitável: somos o quarto maior mercado de automóveis do mundo, o terceiro de cosméticos e produtos de higiene pessoal, o sétimo em comércio eletrônico — e por aí vai. Não vamos desprezar o que já conseguimos, não seria justo.
O problema é que o medo está de volta. E não é o temor do desconhecido, do espectro de um governo supostamente radical, de um bicho-papão expropriador. Desta vez o brasileiro vê e tenta fugir do fantasma daquilo que já conhece.
Tem medo de que não venham coisas novas, de que a vida pare de melhorar, de que sejamos condenados a ser uma nação do pelotão médio — emparedada entre as economias de baixo custo e as inovadoras. Estamos contrariados e emburrados porque nossa expectativa de progresso não se realizou — pelo menos, não na velocidade que queríamos.
Não há nada de reacionário nesse sentimento. Ele seria revolucionário se um de seus efeitos colaterais não fosse tremendamente perverso. O Brasil não parou só para ver a Copa. Em 2014, empresas, consumidores, investidores decidiram sentar e esperar o que vem por aí, após as eleições.
É essa paralisia que explica uma projeção de crescimento de pouco mais de 1% do PIB num ano que, se não é de euforia, também não é de depressão mundial. É esse “esperar para ver” que também ajuda a derrubar a taxa de investimento num país que precisa de tudo para voltar a se mexer.
Nos dois últimos anos, os investimentos públicos e privados só não foram menores do que os de 2009, quando a economia global estava de joelhos. Os efeitos são democráticos.
O desemprego no Brasil é, hoje, um dos mais baixos da história. Mas o saldo de criação de postos em maio foi o menor em 22 anos. Dizer isso não é ser do contra. É render-se aos fatos. Uma hora, anos sucessivos de baixo crescimento vão cobrar a fatura no que é mais precioso para o povo e para as intenções eleitorais dos políticos: trabalho e renda.
O medo, a apatia, o desalento são reações facilmente explicáveis no contexto em que vivemos. O problema é que não são solução para nada. Só aprofundam o buraco do qual tentamos escapar. Como ocorreu no longínquo 1989, a saída pelo aeroporto vem sendo cada vez mais citada por parte da sociedade brasileira. No geral, é só mais uma bravata.
As elites — esse palavrão que rotula gente que teve a sorte, a oportunidade e/ou a competência para ter mais renda, mais educação, mais comida, empregos melhores — não têm o direito de se acovardar num momento em que o país precisa escolher entre ficar onde está e avançar, ainda que com sacrifícios para todos.
É em momentos em que tudo parece nebuloso que a razão tem de vir à tona e as vozes devem se levantar. É hora de pressão não por privilégios, mas para que se faça o melhor para o país. Não adianta querer mudanças. É preciso exigir, por meios democráticos, que elas aconteçam. É preciso provocá-las. Sentar, chorar ou comprar uma casa em Miami serão só admissões de nosso fracasso como povo.
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